
Mas,
perceba, por detrás da malícia ou da absorção sem filtro há uma tendência à
segregação. Se você não está em tal canto, servindo-se e gozando, você não está
no “mundo”. Tem-se a frágil percepção, principalmente quanto aos mais jovens,
que estar em tal lugar corresponde ao ingresso e à aceitação no grupo “seleto”.
E isso ainda tem outra implicação, como enxergam os pobres, já tão
marginalizados? Fica a reflexão.
As
pessoas caem como um passarinho ingênuo nessa esparrela. Vivemos num cenário
secular de divisões, castas, “fulano é melhor que ciclano”, ainda mais hoje
nesse cabeçudíssimo ambiente político, o qual alimenta que certa ideia “tem” de
prevalecer forçadamente. Como expõe o lúcido Eduardo Marinho, a posição vendida de que
sujeito tem de ser melhor, vencer, torna-se uma obsessão na mente de muitos, o
compromisso permanente na luta de classes.
Voltemos
ao passado-presente do Brasil. Em 1888 foi abolida a escravatura no Brasil,
após uma sequencia lenta, com vários entraves e a pressão já insustentável da
Inglaterra, de leis tendentes a preservar e a não prejudicar o comércio de “coisas”
no Brasil (Lei do Ventre Livre e Lei dos Sexagenários). Primeiro o poder e a
sua dificuldade de aceitar perder bens (pessoas), depois o problema de reconhecimento,
em tê-los como iguais.
Numa
diferença menor que três gerações, ainda há ranços de escravidão, de preconceitos
espalhados pelo país. É muito recente a passagem da barbárie para a
civilização, ou não. Algum leitor pode enxergar exagero, como
certos discursos rasos definem: “mimimi”, mas as provas estão aí: ódio
disfarçado de piada, agressões verbais e físicas etc. A verdade é que se
colocar numa posição de superioridade ~ sem generalizar ~ é automaticamente abri-se uma dimensão de
oportunidades e distinções, poder e nobreza.
Palavras
como top e vip acabam por reforçar essa divisão de castas, a ilusão de que um
cidadão comum não poderia ter acesso a certos condições de vida digna e oportunidades. Se
todos somos iguais perante a lei, que isto se materialize pela alteridade, de
nos percebermos iguais efetivamente, no mundo real, nas atitudes, em desejar
ocupar o status de cidadão comum, como dizia o poeta sobralense. Ou diria simplesmente: cidadão, já bastaria, como de fato o somos. E não há nada de mal nisso, pelo
contrário, já que somos iguais. “Que a terra lhe seja leve”.
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